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sexta-feira, 14 de maio de 2010

Saldanha Sanches

Leio no Da Literatura que morreu Saldanha Sanches. Conheci-o, talcomo à Maria José Morgado e a tantos outros que há muito me não conhecem ou me esqueceram, na agitação revolucionária do início dos anos 70. Era então figura carismática e respeitada no nosso meio, pela idade, pelo passado (tinha acabado de cumprir sete anos em Peniche pelo PCP), pela clareza das suas posições. Depressa jovens turcos, muito mais radicais, o promoveram e o viriam a precipitar em desgraça, culminando com a sua expulsão por seguir a linha de direita, coisa que, pouco depois, também me sucederia...
Fica a memória de um homem que sempre respeitei, que sempre admirei, que muito gostava de ouvir na televisão. À viúva, que não lerá este post, a expressão da minha solidariedade nesta partida do companheiro de uma vida para a prisão sem regresso. E, apesar de tudo, fica também a saudade daqueles tempos loucos e gloriosos, em que lutávamos, não contra as propinas e quejandos, mas contra a guerra colonial, a ditadura fascista, a pide, a repressão -- e arriscávamos a vida, a liberdade, o futuro. Desses tempos, deixei vestígios em Do lacrau e da sua picada:
(Tantos anos se passaram já! Contudo, fecho os olhos e continuo a ver, fascinado, os escorpiões passeando pelas mãos calejadas do curandeiro, ressequidas e tostadas por uma vida de trabalho de sol a sol, o olhar honesto de quem recusa usar o seu dom para fugir à enxada, com o brilho de quem está disposto a sofrer e a morrer pela sua verdade, mesmo que ela resida no ferrão peçonhento de um lacrau, macho ou fêmea, tanto faz. Ah, como o compreendo, eu que também tive uma verdade, venenosa como aqueles escorpiões, e a perdi algures no tempo, juntamente com a minha mocidade!)

1 comentário:

Reinaldo Amarante disse...

"...lutávamos, não contra as propinas e quejandos, mas contra a guerra colonial, a ditadura fascista, a pide, a repressão -- e arriscávamos a vida, a liberdade, o futuro...".
É isto que talvez falte à maioria do pessoal de hoje. Objectivos não faltarão, mas eventualmente capacidade de os identificar e assumir. Que as lutas não começam hoje e terminam ontem... Porque estão habituados a terem tudo sem grande esforço. Abrem a boca e antes de a fecharem já têm o que querem...